ESCAPOU ENTRE AS MÃOS

Perdeu para si mesmo o time que só precisava de um gol para desentalar um grito preso há 41 anos 

 

 

Foto: Ricardo Duarte


 

Na noite desta quinta-feira (25), o Colorado recebeu no Gigante da Beira Rio a equipe do Corinthians pela derradeira 38ª rodada do Campeonato Brasileiro. Com um placar que ficou no tudo igual de um 0x0, o Internacional deixou escapar um título que nunca esteve tão entre seus dedos.

Com todas as equipes jogando ao mesmo tempo, o time que entrou em campo tinha muito pouco tempo para se preocupar com o que acontecia no Morumbi. Se o título brasileiro já não dependia somente de si mesmo e o Inter precisava ainda contar com o São Paulo freando o Flamengo, a equipe só esqueceu de fazer o mais importante, a sua parte.

Na partida, sobrou nervosismo e falta de maturidade da equipe da casa. O Inter entrou como em todas as “decisões“ recentes, sem saber o que fazer ou como fazer uma missão que não era tão impossível assim. Do outro lado, o 12º colocado, uma equipe que viveu mais entre conflitos e flertes com a segunda página da tabela do que por disputar algo, o que torna os requintes de crueldade do que aconteceu ainda mais refinados.

O time que não disputou nada resolveu fazer o jogo da vida em campo, é compreensível até. O time que precisava de um gol, que fosse daqueles “gols cagados” tão abençoados por Abel ou ainda um daqueles muito bem construídos do primeiro turno, não fez… Balançar as redes até balançou, mais de uma vez inclusive, mas em todas elas havia uma regra para anular e voltar o marcador ao 0.

Na capital paulista, o tricolor fazia o seu dever em prol da felicidade alvirrubra. Por duas vezes, os berros de Rodinei na arquibancada avisaram que só bastava fazer o seu. O São Paulo vencia lá por 2x1, mas o Colorado, dentro de casa, com Patrick na posição invertida, com Mazzeti estreando no profissional em uma partida tão decisiva, guardou o melhor para o último minuto.

Já com a partida encerrada no Morumbi, o Inter foi para o tudo ou nada. Aos 51’, Edenilson marcou. Era o gol que desafogaria gerações, foi o gol que fecharia ciclos que obrigatoriamente serão fechados de uma forma feliz, mas a alegria durou 30 segundos, até o gol ser anulado por impedimento, sacramentando que por si só o Internacional perdeu algo que estava em suas mãos, o título brasileiro de 2020.

 

 

Foto: Reprodução/internet

 

Muita coisa foi dita e julgada no pós jogo, erros de arbitragem dentro da partida e/ou em jogos recentes, mas por maiores interferências que possam ter havido ali, não se pode usar de bengala para um time que precisava somente de um jogo para decidir por si só pelo que lutou durante a temporada.

 

O ADEUS A TEMPORADA

 

O Inter que chegou a disputa do título não tinha nem como estar ali, a temporada 2020 que começou antes de tudo virar de ponta cabeça, iniciou com um planejamento, com uma perspectiva de ser diferente. A chegada de Eduardo Coudet e tudo que envolvia seu estilo de jogo, suas filosofias ofensivas, sua gritaria à beira do gramado. A montagem do elenco com um orçamento mínimo e esticado ao máximo, a reviravolta que deveria acontecer após acompanhar a Copa do Brasil sendo levada embora dentro da própria casa.

 

 

Foto: Eduardo Schemes

 

O Inter que deixou o Brasileirão escapar entre os dedos, antes de tudo, já havia sido implodido e remontado bem no meio da temporada, acompanhado de perto quando o exterior ao Beira Rio inundou o futebol e a casamata de dúvidas, de abismos. Quando um dirigente que não tinha nem planos de prosseguir foi pilar e combustível de saídas que até hoje são questionadas.

Na Padre Cacique se viu eleições escancararem a podridão de interesses pessoais sobrepostos ao clube, de dirigentes que não questionaram em nenhum momento a possibilidade colocar o Clube do Povo no banco dos réus para não deixarem de mamar nas tetas do clube. 

A torcida, de olhos mais abertos do que nunca, foi lá e mostrou sua força, fez das eleições a maior da história do futebol brasileiro, acolheu aquele que foi usado como escudo sentimental de um ex-presidente nascido para o mais absoluto fracasso. 

Depois dos erros e de olharmos para um clube que não brigaria por nada, que lutaria por se manter no meio da tabela, o Saci tirou forças das místicas de uma torcida apaixonada e de um técnico campeão, levantou e com um pé só embalou e marcou história. Com 4 dos jogadores mais importantes da temporada lesionados em momentos decisivos, ainda assim, venceu até os jogos improváveis, conquistou 27 em 27 pontos disputados, fez o que não havia ainda sido feito: 09 vitórias consecutivas.

O Colorado bateu na trave como nunca antes, deixou o campeonato escapar por incompetência em marcar um gol em uma equipe que todos marcaram, mas tudo que o trouxe até este momento não pode e não deve ser ignorado, dos aprendizados às reviravoltas, dos erros de deixar uma imprensa deprimente adentrarem no vestiário aos gritos de euforia e desabafo à cada vitória. 

Que demos adeus à uma temporada que deixou uma ferida profunda, mas que saibamos lambê-la sendo capazes de olhar para a cicatriz sem esquecer o porquê dela existir.

 

MUITO OBRIGADA ABEL

 

Dos personagens que fizeram o 2020 Colorado tão memorável, Abel Braga já chegou como figura carimbada. Em meio as despedidas e a incompreensão da saída de Eduardo Coudet, Abelão chegou enrolado às memórias afetivas de conquistas douradas, de lugares onde levou o Inter e que outrora não foram mais alcançados. 

Abel chegou porque tinha que ser, não poderia ser outro a fazer, da mesma maneira nenhum outro merecia tanto.

 

Foto: Ricardo Duarte

 

Desacreditado, criticado por mim inclusive, e muitas vezes. 

Abelão veio porque, no final das contas, ele ainda precisava se despedir, o ciclo ainda precisava se fechar e nem o mais otimista ou o mais pessimista dos torcedores conseguiria prever tal cenário.

Ao fim da 38ª rodada do Campeonato Brasileiro 2020, Abel Braga com 340 jogos na história da casamata Colorada despediu-se do clube que o levou ao topo do mundo. Em 25 de fevereiro de 2020, Inter e Abel Braga fecharam um ciclo que em sua maioria foi escrito por amor e conquistas, por reviravoltas e a magia de amar o futebol.

Ao Abel que eu muito critiquei, que eu questionei muitas vezes durante essa história que é nossa, o meu muito obrigada.

 

Por Jéssica Salini

 

*Esclarecemos que os textos trazidos nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do Portal Mulheres em Campo